Exclusivo: "Eu já estava com uma certa impaciência com a ameaça da saída de Marina", diz Penna
Presidente do PV há 12 anos, o deputado federal José Luiz Penna rebate as críticas da ex-senadora Marina Silva
“Eu já estava com uma certa impaciência com a ameaça da saída de Marina”
Presidente do PV há 12 anos, o deputado federal José Luiz Penna rebate as críticas da ex-senadora, afirma que o partido não pode virar barriga de aluguel para Alfredo Sirkis e, contra as insinuações de que é autoritário, diz que não manda nem na própria casa.
De Buraquinho, praia em Lauro de Freitas, a 30 quilômetros de Salvador (BA), onde costuma passar os finais de semana com a mulher Patrícia em casa de familiares, o presidente do Partido Verde, deputado federal José Luiz Penna (PV-SP) falou à coluna com exclusividade. Depois de acompanhar em Brasília o discurso de desfiliação do Partido Verde da ex-senadora Marina Silva, Penna preferiu ficar recluso e pegou o último voo de quinta-feira 7 para Salvador. Alvo de críticas, decidiu falar na noite desta sexta-feira 8. “Aqui na Bahia tudo fica mais fácil”, disse ele.
Foi uma perda a saída de Marina Silva do PV?
Foi uma perda, pode resultar num quadro político interessante. Podemos não repetir o resultado que tivemos nas urnas.
Achou que Marina foi agressiva na saída do Partido? Colocou o senhor numa situação delicada?
Eu já estava com uma certa impaciência com a ameaça da saída dela. Acho que é uma perda, mas precisávamos de um desfecho para a situação que foi criada. Ou fazia como Dom Pedro “Digo ao povo que fico”, ou sai, e ela fez a segunda opção. Temos que respeitar, não somos crianças. É muito difícil para uma pessoa que vem de outras experiências compreender este processo do PV. Há consultas, várias reuniões, reconheço que é complicado. Não temos nenhum apreço ao autoritarismo, mas também não vamos submeter essa vontade de um partido horizontal a decisões individuais.
Considera que foi um capricho individual da ex-senadora?
Foi a visão dela e a intransigência não foi nossa. Fizemos várias concessões, colocamos dez membros na executiva ligados a ela. O que era possível, fizemos. Agora temos um processo. A relação dos correligionários não é uma relação de seguidores, os compromissos são firmados a cada dia.
Ficou a sensação de que o senhor dominava o PV e a Marina não tinha espaço. Foi isso?
São experiências muito diferentes. É mais fácil pela ótica dela passar para a imprensa que éramos intransigentes. Eu não sei mandar em ninguém, não mando nem na minha casa. Não posso ter um coletivo que vota a cada dois anos. Essa direção é reconduzida, não posso pensar em não consultar essa direção.
Sentiu-se traído por Alfredo Sikis?
Acredito que discordar é da vida. Ele acha que eu estou errado e eu acho que ele está errado. Agora temos idade e trajetória de vida suficientes para esperar que o tempo esclareça quem tem razão. Estou convencido de que os processos de partidos precisam ser mantidos. Não é um fato eleitoral que põe em cheque um processo de uma organização política extremamente original. Não viemos de nenhuma via tradicional de poder. Não viemos de sindicados, forças armadas, organizações comerciais. É preciso entender que o projeto do PV é original e demanda um esforço gigantesco para se concretizar.
O senhor acha que 12 anos é muito tempo no cargo de presidente do PV ?
Presidente é um nome que não tem correspondência ao meu cargo no Partido. Na verdade sou um porta-voz, e só não mudamos esse nome porque temos a inspiração parlamentarista e porque porta-voz só aparece na mídia brasileira para dizer que o presidente morreu ou está gravemente enfermo. Não é a presidência, é um coletivo de dirigentes onde eu faço a comunicação pública com a sociedade. É outra visão. Acredito que este conflito de visões com a Marina não se resolveu.
Marina deixou implícito que pode pedir para pessoas não votarem no PV, o senhor interpretou isto como uma ameaça?
Acho que no instante que uma pessoa deixa uma organização tem o livre-arbítrio. E está descompromissada a votar nela. Podemos estar juntos a ela ou contra, disputando. Marina é honrada, descente e tem a liberdade de tomar as atitudes que achar melhor.
Como fica a reestruturação do PV com a saída dos “marineiros”?
Não são tantos assim. Aliás o Partido continua trabalhando, produzindo, essa crise se deu muito na mídia. Internamente, as preocupações são e serão as eleições de 2012.
Marina teve mais de 19 milhões de votos nas eleições presidenciais. O PV se esvazia com sua saída?
É uma perda, mas a grande vitória foi a análise política feita. Desde a campanha municipal do Gabeira no Rio, sentimos a sociedade se inclinando para o PV. Achávamos que era a hora de ter um candidato à presidência. Tivemos uma reunião com o escritor Augusto Cury, eu queria que ele saísse candidato. Quando estávamos no processo me deram noticias da possibilidade da Marina, e ela era muito mais forte. A grande vitória que o Partido também tem foi de análise política. Espero que a gente continue com a capacidade de antever os processos cada dia melhor. Com isso conseguimos colocar a variável ambiental na eleição, comprometimento dos candidatos com esta questão por escrito no segundo turno.
Como imagina o futuro de Marina fora do PV?
A utopia ambientalista vai formar vários programas partidários. Não podemos querer ser os únicos. Essa é uma questão de toda sociedade. Haverá espaço para outros partidos. Agora, eu acho que Marina tem toda condição de estar na ponta disputando a presidência ou o cargo que ela quiser com possibilidade de ter ótimos resultados.
A presidência do PV continua com o senhor?
Isto foi votado no início do ano e permaneço na presidência até 17 de março de 2012. Não sei qual é a vontade deste coletivo, mas quero ter o direito de pensar o melhor para mim porque foram anos duríssimos. Quando assumi a presidência, em 1999, não tínhamos estrutura partidária qualquer. Isso foi feito por este grupo com uma tenacidade incrível. Como não somos um partido das vias tradicionais, nosso tempo não segue a lógica natural dos demais partidos. Nosso tempo é muito mais lento, mais difícil. Lembro que na campanha de Fernando Gabeira em 1989 à presidência da Republica as pessoas nos achavam seres exóticos, intelectuais delirantes. Dificuldades eram criadas a cada passo. Quando íamos a uma discussão sobre as drogas que era um assunto de toda sociedade, portanto político, fomos marcados como incentivadores do uso das drogas. O mesmo em relação ao aborto, nos jogando contra as correntes religiosas. Estávamos defendendo a vida das nossas mulheres. Era um problema de toda a sociedade. Quantas foram esterilizada, quantas faleceram em clinicas clandestinas. Foi um trajeto muito pioneiro em um sociedade extremamente conservadora.
O que considera melhor para o senhor, sair ou permanecer na presidência do PV? Estou vendo, tudo tem um tempo. Eu permanecerei até março. Acha saudável um mandato longo como o seu?
O PV não tinham quadros políticos. Como nossa trajetória é original, a secretaria de organização, tesouraria, entender a prestação de contas, é um capítulo completamente alucinado. Fazer quadros para isso demanda muito tempo. Tenho orgulho da minha gestão, de que nós tivemos a paciência de preparar pessoas para essas funções.
Se continuasse no PV, Marina naturalmente iria para a presidência do partido?
Isso dependia dela e do coletivo do partido. Não tenho uma bola de cristal. Eu nunca vi concretamente vontade dela neste sentido. Demanda muito tempo, muito desgaste.
O que ela queria, na sua visão?
Queria fazer com que o PV tivesse a imagem que ela considera ideal para ele.
Qual imagem?
Por exemplo, se somos um partido com inspiração parlamentarista, como vamos fazer eleição direta? Isso eu estou dizendo a história mais elementar. Agora há posicionamentos. Em relação ao governo, por exemplo, tivemos uma relação de independência no segundo turno. Nós vamos dialogar com o governo, mas isso ficou perdido no caminho.
Acha então que a polêmica, como disse a nota oficial do PV, foi “artificialmente inflada”?
Sim, ou tem motivos inconfessos nesta história. Porque do nosso lado não falamos absolutamente nada.
Marina fala em “dificuldades, maledicências, armadilhas”. Isso existiu?
Foi um desentendimento, a falta de compreensão, de visão sobre o partido. Ou algo que não chegou a mim.
Ficou magoado?
Não. Nós, que estamos no Parlamento, nos acostumamos a este tipo de embate. Não é pessoal. São pessoas dignas, honradas, que podem estar em qualquer organização. Isto sem sombra de dúvidas. Tivemos desentendimentos.
A saída do empresário Guilherme Leal traz perdas ao PV sob o aspecto econômico?
Nunca tivemos relações econômicas com o Guilherme. Reconhecemos que ele é um velho militante ambientalista. Ele entrou pelas mãos da Marina e continuou com ela, o que foi bom, porque toda a campanha de Marina foi financiada pelo PV. Mas depois foi estabelecido o Comitê Financeiro e tivemos apenas em representante do PV para orientar o que pode ou não porque temos um nível de responsabilidade grande em qualquer candidatura. Era essa a relação. Todo tempo que estivemos juntos interviu sempre de maneira muito própria tanto nos momentos mais difíceis como o da opção no segundo turno. Mas no Partido era apenas um filiado. Neste embate não houve interferência pública nenhuma do Guilherme.
Como fica a relação de Alfredo Sirkis com o partido, que entrega o cargo de direção e não sai do PV?
Esta é uma engenharia difícil, nem eu sei. Vamos observar, conversar muito para ver como vamos equalizar isso. Não dá para sermos caracterizamos como barriga de aluguel. Vamos deliberar isso com muita conversa porque é uma situação inusitada. Teremos que amadurecer e ver o que é possível.
Gisele Vitória e Bela Megale
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