terça-feira, 3 de agosto de 2010

O mundo está de cabeça para baixo

Durante algum tempo o mundo foi plano. Agora ele está de cabeça para baixo. Para compreender isso, inverta sua forma de raciocinar. Veja o mundo desenvolvido como dependente do mundo em desenvolvimento, em vez do outro modo. Entenda que dois terços do crescimento econômico global no ano passado vieram dos países emergentes, cujas economias vão se expandir cerca de 6,7% em 2008, contra 1,3% para os Estados Unidos, o Japão e os países da zona do euro. A drástica elevação nos preços de energia, commodities, metais e minerais produzidos principalmente no mundo em desenvolvimento explica parte dessa mudança. Isso criou os superávits de balança de pagamentos que abastecem a enxurrada de dólares para os ricos fundos soberanos em países como a China. Eles se divertem escolhendo uma participação na BP aqui, uma parte do Morgan Stanley ali e, porque não, umas lascas na Total. Nós, espécies paleolíticas do mundo desenvolvido somos alvos das críticas dos novos ricos agora, com nosso papel de predador exaurido. Os Estados Unidos e a Europa poderão em breve necessitar de toda a caridade que conseguirem obter. Para dar uma idéia melhor dessa inversão, ajuda estar no Brasil, onde o inverno (forma de falar) chega com o verão no hemisfério norte, e o otimismo econômico, tão exuberante quanto a vegetação, aumenta no mesmo ritmo acelerado das execuções de hipotecas nos Estados Unidos.Imensas descobertas de petróleos nos campos em alto mar, um boom no etanol de cana-de-açúcar, vastas reservas de terras aráveis não utilizadas, riqueza mineral e abundante água fresca contribuem para o entusiasmo brasileiro. Mas os recursos naturais formam apenas uma parte da história. Como na China e na Índia, um mercado interno em expansão está impulsionando o crescimento. Da mesma forma, está aumentando a sofisticação corporativa e a ambição global.

No Fórum Nacional anual - uma reunião de líderes empresariais - senti-me como um insignificante representante do primeiro mundo enquanto os líderes da companhia nacional de energia Petrobras (maior que a BP, a Shell e a Total) e Companhia Vale do Rio Doce, ou CVRD (a segunda maior mineradora do mundo), despejavam estatísticas assombrosas. A Petrobras, que está à frente do vigoroso esforço do Brasil em direção à auto-suficiência depois da pesada dependência de petróleo importado, há 30 anos, vai mais que duplicar a produção de petróleo para 4,2 milhões de barris diários em 2015, dos atuais 1,9 milhão de barris."Com as mais recentes descobertas, o Atlântico Sul vai se tornar um imenso produtor de petróleo", prevê José Sérgio Gabrielli de Azevedo, seu principal executivo. Roger Agnelli da CVRD dispensa os Estados Unidos ("tem muitas dívidas") para concentrar-se nas ambições da empresa na Ásia. É imperativo estar lá, ele disse, porque é lá que estão o crescimento, o capital e a ambição. A China, ele observou, responderá por 55% do consumo de minério de ferro, 31,6% do níquel e 42% do alumínio até 2012. Não é preciso dizer mais nada.

Como muitas outras grandes corporações dos mercados emergentes, a CVRD está realizando uma série de aquisições. Não são apenas os fundos soberanos que estão adquirindo empresas no primeiro mundo hoje em dia. São os novos gigantes do NAN ("Newly Acquisitive Nations" ou países recém-compradores).As fusões e aquisições nos mercados emergentes estão em alta de 17% no ano, crescendo para US$ 218 bilhões, enquanto no restante do mundo estão em queda de 43%, para US$ 991 bilhões, segundo a Thomson Reuters.O Relatório de 2007 sobre Investimento Mundial da Unctad disse que o investimento estrangeiro direto no mundo em desenvolvimento totalizou US$ 193 bilhões em 2006, em comparação com a média anual para a década de 1990 de US$ 54 bilhões. Os números para os EUA em 2006 foram de US$ 216,6 bilhões.

A CVRD comprou a Inco do Canadá, uma mineradora de níquel, por US$ 17 bilhões em 2006. Quase comprou a mineradora anglo-suíça Xstrata por US$ 90 bilhões este ano. Na semana passada, a Vendanta Resources da Índia, chegou a um acordo de US$ 2,6 bilhões para a compra da mineradora norte-americana de cobre, Asarco. Esse acerto está sendo contestado pelo Grupo México, criando um combate latino-americano-asiático por uma empresa dos EUA.

Se você está achando difícil compreender isso, tente ficar de cabeça para baixo. Essa também é uma boa posição para se apreciar a compra da Land Rover e Jaguar, da Ford, pela Tata Motors da Índia por US$ 2,3 bilhões, ou a aquisição, pela Tata Steel, no ano passado, da siderúrgica anglo-holandesa Corus Group, por US$ 12 bilhões.A globalização agora é uma via de mão dupla; na verdade, é uma rua indiana com o tráfego insinuando-se em todas as direções. "Em um mundo invertido, não só as economias em desenvolvimento tornaram-se forças dominantes nas exportações globais, no espaço de uns poucos anos, como suas empresas estão se transformando em importantes players na economia global, desafiando os poderosos que dominaram o cenário internacional no século 20", disse Cláudio Frischtak, economista e consultor brasileiro.

A mudança que está acontecendo no poder econômico tem implicações que ainda não foram captadas pelo mundo desenvolvido. Claro que o G-8 e a constituição dos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU precisam ser mudados para refletir essa mudança. O século 21 não poderá ser conduzido com instituições do século 20. Isso é óbvio. Menos óbvio é saber como os Estados Unidos, que garantem a segurança global a um grande custo, começarão a dividir esse ônus, para que a nova multi-polaridade de riqueza seja refletida em uma multi-polaridade de compromissos.A postura de lótus (em Yoga, apoiando-se sobre a cabeça) é adequada para o próximo presidente dos EUA.


Fonte: Roger Cohen* Rio de Janeiro

*Roger Cohen é editor do The International Herald Tribune Tradução: Claudia Dall'Antonia.


For a while the world was flat. Now it's upside down.
To understand it, invert your thinking. See the developed world as depending on the developing world, rather than the other way round. Understand that two-thirds of global economic growth last year came from emerging countries, whose economies will expand about 6.7 percent in 2008, against 1.3 percent for the United States, Japan and euro zone states.
The sharp rise in prices for energy, commodities, metals and minerals produced mainly in the developing world explains part of this shift. That has created the balance of payments surpluses fueling dollar-dripping sovereign wealth funds in the gulf and East Asia. They amuse themselves picking up a stake in BP here, a chunk of Morgan Stanley there, and why not a sliver of Total.
We of the developed-world Paleolithic species are fair game for the upstarts now, our predator role exhausted. The U.S. and Europe may one day need all the charity they can get.
To place this inversion in focus, it helps to be in Brazil, where winter (so to speak) arrives with the Northern Hemisphere summer, and economic optimism, as exuberant as the vegetation, increases at the same brisk clip as U.S. foreclosures.
Huge offshore oil finds, a sugarcane ethanol boom, vast reserves of unused arable land, mineral wealth and abundant fresh water contribute to Brazilian buoyancy. But natural resources are only part of the story. As in China and India, an expanding internal market is bolstering growth. So is increasing corporate sophistication and global ambition.
At the annual National Forum, a gathering of business leaders, I felt like a first-world pipsqueak as leaders of the national energy company Petrobras (bigger than BP, Shell and Total) and Companhia Vale do Rio Doce, or C.V.R.D. (the world's second largest mining company), reeled off head-turning statistics.
Petrobras, which has spearheaded Brazil's push to self-sufficiency from heavy dependence on imported oil 30 years ago, will more than double oil production to 4.2 million barrels a day in 2015 from 1.9 million barrels today.
"With the latest discoveries, the South Atlantic will become a huge oil producer," predicted Jose Sergio Gabrielli de Azvedo, its chief executive.
Roger Agnelli of C.V.R.D. waved away the United States ("It's full of debt") to focus on the company's ambitions in Asia. It was imperative to be there, he said, because that's where growth, capital and ambition are. China, he noted, will account for 55 percent of iron ore consumption, 31.6 percent of nickel, and 42 percent of aluminum by 2012. Case closed.
Like many other big emerging-market corporations, C.V.R.D. has been on a buying spree. It's not just sovereign wealth funds that are acquiring first-world companies these days. It's the new giants of the NAN (Newly Acquisitive Nations).
Emerging-market mergers and acquisitions are up 17 percent this year to $218 billion, while for the rest of the world they're down 43 percent to $991 billion, according to Thomson Reuters.
The 2007 Unctad World Investment Report said developing-world direct foreign investment totaled $193 billion in 2006, compared with a 1990s annual average of $54 billion. The U.S. 2006 figure was $216.6 billion.
C.V.R.D. bought Canada's Inco, a nickel miner, for $17 billion in 2006. It came close to acquiring the Anglo-Swiss miner Xstrata for $90 billion this year. Just last week, India's Vedanta Resources reached a $2.6 billion deal to buy U.S. copper miner Asarco.
That deal is being challenged by Grupo Mexico, creating a Latin-American-Asian fight for a U.S. company.
If you have trouble getting your mind around that, try standing on your head.
That's also a good position from which to view India's Tata Motors agreeing to buy Land Rover and Jaguar from Ford for $2.3 billion, or Tata Steel's acquisition last year of the Anglo-Dutch Corus Group steel company for $12 billion.
Globalization is now a two-way street; in fact it's an Indian street with traffic weaving in all directions.
"In an inverted world, not only have developing economies become dominant forces in global exports in the space of a few years, but their companies are becoming major players in the global economy, challenging the incumbents that dominated the international scene in the 20th century," said Claudio Frischtak, a Brazilian economist and consultant.
A shift in economic power is under way to which the developed world has not yet adjusted. Of course the G-8 and the permanent membership of the U.N. Security Council need to be expanded to reflect this change. The 21st century can't be handled with 20th-century institutions.
That's obvious. Less obvious is how the United States, which underwrites global security at vast expense, begins to share this burden, so that the new multi-polarity of wealth is reflected in a multipolarity of security commitments.
Headstands are in order for the next U.S. president.

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